1. SURJE UMA NOVA TEOLOGIA
Um livro, publicado em 1943, abalou a
Igreja francesa. O Pe. Henrique Godin, assessor do Movimento da Juventude
Católica e ajudado pelo seu colega Michauneau denunciou a crise religiosa da
França e analisou o que estava acontecendo com o catolicismo daquele pais. O
livro profético: “França, pais de missão”, tornou-se tema de discussão nacional
nos anos seguintes. E provocou iniciativas fecundas que repercutiram no
catolicismo mundial: surgiu a “Missión de France”, com os Padres Operários; e
nasceu uma Nova Teologia que acabou tendo, vinte anos mais tarde, uma
influencia importantíssima nos documentos do Concilio Vaticano II.
A equipe de teólogos jesuítas de Lyon-
Danielou, Henri de Lubac; os dominicanos de Saulchoir[1] –
Dominique-Marie Chenu e Yves Congar escreveram artigos “explosivos” que
questionavam a fundo, a teologia dominante depois do Concilio de Trento, a
Neo-Escolástica (de João de Santo Tomas, Suarez, Bañez e companheiros) e
propunham uma nova maneira de fazer teologia.
É
o que vamos resumir em seguida.
Esses teólogos e outros que foram
seguindo no mesmo sendeiro, não se apresentavam como um movimento ou uma escola
teológica.
O famoso
Pe. Garrigou-LaGrange,OP, saiu em defesa
do Tomismo, ou seja, da teologia constantemente apoiada como “oficial” do
catolicismo ( Leão XIII, Pio XII), e criticou os que estavam fazendo uma nova
teologia. Com isso, praticamente batizou o método crítico-histórico-indutivo de
seus colegas os teólogos dominicanas, jesuítas como uma “NOVELLE THEOLOGIE”.
Não se constituiu um grupo formal de
afiliados à nova maneira de fazer teologia, mas se multiplicaram os teólogos
dessa nova geração, tanto na França, Bélgica, Holanda, Alemanha, Suiça e depois
em outras partes do mundo, entre eles os mais famosos: Hans Urs Von Balthazar,
Edouard Schillebeeckx, Lois Boyer, Karl Rahner, Joseph Ratzinger, Gerard
Philip, Hans Küng, Etienne Gilson, Jean
Morou, Louis Charlier, R. Dragnet...[2] .
Partiam das seguintes constatações:
+ A teologia
escolástica, se distanciava de Tomas de Aquino, embora continuasse usando o seu
nome. A neo-escolástica era um ensinamento de manuais, distanciado da vida,
a-histórico, rígido e imposto na formação dos religiosos e clérigos. Depois de
Trento deixou de ser uma eclesiologia para ser uma hierarqueologia,
+ A
mensagem estava sendo proclamada de cima para baixo, como verdade imutável,
definitiva, indiscutível, sem tomar em consideração a capacidade de recepção
dos destinatários, nas circunstancias em que se encontravam.
+ Essa
transmissão do Evangelho deixava de ser Boa Nova. As pessoas não sentiam que
era “nova” e nem que era “boa”. Sempre se dizia o mesmo, embora as realidades
houvessem mudado.
+ Era o
imobilismo do pensamento grego. Não tinha sentido histórico. Era essencialista e desconhecia a subjetividade
humana. Estava fora da quotidianidade do Povo de Deus. Era incapaz de oferecer
aos contemporâneos, alimento espiritual e doutrinal. Estava desligada da
pastoral e da espiritualidade
+ Essa
teologia não era assumida pelos fieis. Não podiam sentir sua bondade ou
maldade. – “Então, se perguntavam os
teólogo e pastores, como é que nos primeiros tempos do cristianismo a Mensagem
impactava, orientava as pessoas e os povos?”
2. CARACTERÍSTICA DA NOVA TEOLOGIA
A nova maneira de refletir sobre a fé, ou
seja, “fazer teologia”, rompeu o mito da neo-escolástica, considerada uma
teologia particular indevidamente universalizada.
Essa nova maneira teológica, de um lado
mantinha a seriedade doutrinal, sua volta ao passado não era uma obsessão por
ele (“Repristinicação” como dizia Congar). Era um entendimento novo (luz nova)
sobre os desígnios de Deus, sobre a vocação humana (como GS 11 vai dizer, em
1965)
- Foi um
método histórico, indutivo que alcançava a sensibilidade, a imaginação, a
intuição das pessoas. Uma teologia que falava às situações presentes, dentro de
uma sociedade secularizada, recuperando inteligente e criadoramente o passado.
-
Interrogava as fontes da fé cristã com perguntas do tempo atual. Descobria perspectivas que a neo-escolástica
ou não havia descoberto, ou havia deixado de lado ou não estava apta da
enfrenta-las.
- A Nova
teologia segue um dinamismo indutivo partindo das pessoas às referências da
fé. Esta não tinha se esgotado em uma
formulação teórica indiscutível. Duas referências orientam a Nouvelle
Theologie: a Revelação e a Patrística. Esta tradição não se constituiu como uma
força para traz, senão para frente. Nenhuma “tradição” esgotou A TRADIÇÃO.
Então sempre é possível voltar à TRADIÇÃO à luz da Palavra de Deus, para
refletir melhor sobre as realidades contemporâneas.
- Os Padres
da Igreja tomavam em consideração a sensibilidade emocional das pessoas
falando-lhes com símbolos, história, exemplos e as pessoas sentiam que era algo
que chegava às suas vidas. Aceitar ou rejeitar o que se lhes dizia tinha
consequências não tanto na eternidade, senão já agora, aqui mesmo.
A Nova
Teologia não tratava somente de contemplar o mundo, mas de transformá-lo. Assim
é que repetia o pensamento de Etienne Gilson: - “Para ir em frente é preciso ir
para trás e recomeçar”, ou seja, passar de uma tradição menos profunda a outra
mais profunda, aproximando-se mais de uma comunhão intelectual e espiritual com
o cristianismo nos seus momentos mais vitais, finalmente, uma identificação com
Jesus Cristo e com o seu mistério pascoal.
- A
Patrística ensinava o que havia recebido da fonte comum da Revelação. Por isso
a Palavra de Deus era a referência fundamental do que se ensinava e não estava
circunscrita a um sistema teológico, por melhor que fosse. Esse método se
denominou Ressourcement ou seja, ir às Fontes bíblicas e da tradição,
valorizando o instrumento privilegiado da transmissão que foi a Patrística.
- É questão
de recuperar o sentido do mistério, que a Neo Escolástica havia dificultado,
por insistir na sua sistematização dogmática indiscutível, privilegiar o
conceitual, o abstrato, sobre o concreto, com suas imagens e símbolos. O mistério
do Deus pessoal so pode ser alcançado pelo amor, não pela razão.
3. SINAIS DOS TEMPOS
Essa
teologia permitia mais efetivamente considerar os “Sinais dos Tempos”,(Lc
12,54-56), que João XXIII vai propor no seu discurso inaugural do Vaticano II e
daí a necessidade do Aggiornamento (atualização) e de uma responsabilidade
Pastoral que acompanha o conhecimento e análise da realidade.
América Latina vai seguir o mesmo
caminho, desenvolvendo uma teologia que especifica no nosso tempo o que Jesus
advertiu em Mt 25,39 ss, ou seja a “opção prioritária pelo pobre”, que é donde
acontece o encontro salvífico da história (Mt 25,45): “A mim o fizestes”
4.CONFLITOS
Os teólogos
de La Fourviere de Lyon, se lançaram contra a Nouvelle Theologie.
Principalmente Gariggou Lagrange e Labourdette. El Padre Provincial Jesuita,
proibiu a Henri de Lubac, de ensinar. O Santo Oficio fez o mesmo para os padres
Congar, Danielou. Esses três personagens foram chamados por João XXIII como “periti”
no Vaticano II (Assessores) e mais tarde, todos eles foram cardeais.
[1] É o termo para o coletivo da árvore
“Salgueiro-chorão”, a tradução poderia
ser “Salgueiral”, para designar um espaço da residência dominicana, antiga
propriedade dos padres Cistercienses, na Bélgica, onde a Província Francesa dos
Padres da Ordem dos Pregadores, mantinha uma importante escola de teologia.
[2] Seguian pegadas de antigos teólogos
como Moehler, Newman, Gardeil, Rousselot, Charles Peguy, Paul Blondel, Emile
Merwsch, Odo Casel, Romano Guardini, Karl Adam, Anselm Stolz.
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