Ricardo Mariano, sociólogo, professor da PUC de S.
Paulo, numa entrevista à , IHU On-Line afirma:
- “observa-se uma
crescente ocupação religiosa da esfera pública. Isto é, apóstolos, bispos,
missionários e pastores pentecostais, a cada pleito, tentam transformar seus
rebanhos religiosos em currais eleitorais, seja para eleger seus próprios
representantes religiosos ao Legislativo, seja para, em troca de promessas e
benesses diversas, apoiar eleitoralmente candidatos seculares a cargos
majoritários. De outro, verifica-se que candidatos, políticos e partidos de
Norte a Sul do país, independentemente de suas orientações ideológicas, cada
vez mais tentam instrumentalizar a religião para fins político-partidários e
eleitorais. Trata-se, portanto, de uma instrumentalização mútua”.
E continua: - “No
Congresso Nacional e nos legislativos municipais e estaduais a presença e o
ativismo político dos pentecostais vêm ganhando terreno a passos largos.
Trata-se de um ativismo político recheado de moralismo e corporativismo e,
desde a Constituinte, marcado por escândalos. Pesquisa da ONG Transparência Brasil revela que 95% dos membros da bancada
evangélica estão entre os mais faltosos do Congresso Nacional e, em sua
maioria, são objeto de processos judiciais, enquanto, segundo o DIAP, 87% deles
constam entre os ‘mais inexpressivos’”.
As relações entre religião e política no Brasil?De um lado, observa-se uma crescente ocupação religiosa da esfera pública. Isto é, apóstolos, bispos, missionários e pastores pentecostais, a cada pleito, tentam transformar seus rebanhos religiosos em currais eleitorais, seja para eleger seus próprios representantes religiosos ao Legislativo, seja para, em troca de promessas e benesses diversas, apoiar eleitoralmente candidatos seculares a cargos majoritários.
De outro, verifica-se que candidatos, políticos e partidos de Norte a Sul do país, independentemente de suas orientações ideológicas, cada
vez mais tentam instrumentalizar
a religião para fins político-partidários e eleitorais.
IHU On-Line – Considerando a trajetória histórica do
movimento pentecostal no Brasil, o que marca a religiosidade pentecostal
atualmente? Em que sentido ela mais mudou em comparação a 50 anos atrás, por
exemplo? Qual a novidade que a corrente neopentecostal introjetou na vivência
religiosa brasileira?
Ricardo Mariano – A corrente neopentecostal exerceu papel crucial na
transformação do pentecostalismo nacional nas últimas três décadas. Implantou e
disseminou a Teologia da Prosperidade,
abandonou e desprezou antigos usos e costumes de santidade, reduziu, por
princípio e estratégia, o ascetismo e o sectarismo, adotou crenças da teologia
do domínio, enfatizou a guerra espiritual contra o diabo, hipertrofiou e
sistematizou a oferta de soluções mágico-religiosas nos cultos e na mídia,
forjou gestão denominacional em moldes empresariais, investiu pesado no
tele-evangelismo, na música gospel e na aquisição e arrendamento de emissoras
assim como na formação de redes de rádio e TV, encarou a pluralização religiosa
e sociocultural como um desafio evangelístico e de mercado e, tal como a Assembleia de Deus, ingressou na
política partidária na Constituinte. No caso da Igreja Universal, além de
eleger bancadas parlamentares, fundou um partido político, o PRB. Toda essa transformação não
ocorreu só em razão da deliberada disposição das novas lideranças pentecostais
de promover, por razões diversas, tal acomodação às mudanças em curso na
sociedade, mas também das pressões da concorrência religiosa e, sobretudo, dos
constrangimentos impostos pelas demandas por mudança por parte de seus adeptos,
clientes e diferentes públicos-alvo.
Acomodar o pentecostalismo à sociedade brasileira
Acomodar o pentecostalismo à sociedade brasileira
A vertente neopentecostal liderou, portanto, diversas
mudanças e inovações teológicas, estéticas, litúrgicas e comportamentais no
pentecostalismo. Não obstante seu sectarismo no plano religioso, cujo destaque
recai sobre sua demonização dos cultos afro-brasileiros, ela contribuiu
fortemente para acomodar o pentecostalismo à sociedade brasileira. Colaborou,
por exemplo, para abrir espaço ao surgimento e incorporação de artistas,
modelos, surfistas, jogadores de futebol, políticos, rappers, roqueiros,
atletas de Cristo, bandas gospel e até para a formação de blocos evangélicos
carnavalescos: a folia de Cristo.
Desde então, tornou-se possível ser pentecostal e modelo;
ser pentecostal e roqueiro, etc. Tal conjunção identitária, que até há pouco
era inadmissível e radicalmente incompatível com sua moralidade, com seus usos
e costumes e com seu ascetismo, tornou-se repentinamente aceitável. Sinal de
que essa religião, ao se transformar, vai paulatinamente deixando de ser um
retrato negativo da cultura brasileira. Demonstração de que suas fronteiras
identitárias, tanto no plano moral como no comportamental, tornaram-se mais
diluídas, porosas, flexíveis e mais difíceis de distinguir. A ponto de terem
surgido até os traficantes evangélicos, repletos de tatuagens (verdadeiros
amuletos protetores) contendo versículos bíblicos. Mesmo as fronteiras religiosas
mostram-se menos nítidas do que frequentemente se espera.
Pesquisa do Datafolha,
realizada em maio de 2007, mostrou que 8% dos pentecostais tinham um santo
(católico) de devoção e 15% deles acreditavam totalmente em reencarnação
(doutrina de origem hindu disseminada pelo kardecismo no Brasil). Não obstante
tamanha transformação, esses religiosos mantiveram importantes traços ascéticos
e sectários, como a rejeição ao consumo de álcool, do fumo e das drogas, ao
sexo fora do casamento, ao homossexualismo e ao ecumenismo.
- No Brasil, os católicos decresceram, os pentecostais
cresceram aceleradamente entre os mais pobres nas regiões urbanas (sobretudo
nas periferias violentas e desassistidas pelos poderes públicos) e de fronteira
agrícola, os sem religião, grupo que mais cresceu entre 1980 e 2000,
continuaram se expandindo embora num ritmo menor, os espíritas avançaram entre
os estratos sociais de maior renda e escolaridade, os umbandistas, depois de
perderem mais de 144 mil adeptos entre 1980 e 2000, estagnaram na última
década, as Testemunhas de Jeová
(intensamente proselitistas) e as outras religiões continuaram crescendo.
De todo modo, excluindo católicos (64,6%), evangélicos
(22,2%) e sem religião (8%), todas as outras somavam apenas 5% da população
brasileira em 2010. A despeito do avanço dos sem religião, o Brasil retratado
pelo último Censo Demográfico
continua mostrando-se solo dos mais férteis para a prédica religiosa, em
especial para o pentecostalismo. No conjunto, as igrejas pentecostais continuam
crescendo vigorosamente mediante, entre outros recursos e estratégias, o
proselitismo pessoal (efetuado por leigos e, em especial, pelas mulheres) e
midiático e a oferta sistemática de serviços mágico-religiosos (e terapêuticos)
para a solução de problemas pontuais e imediatistas de saúde, psicológicos,
afetivos, familiares, financeiros etc. Com suas promessas mágicas e
taumatúrgicas, aproveitam, sobretudo, a vulnerabilidade social de parcela
considerável da população brasileira, a tradição mágica do catolicismo popular,
o baixo número de padres católicos, o elevado contingente de católicos nominais.
Recrudescimento da competição entre pentecostais e católicos pela hegemonia religiosa no país. Tal competição intrarreligiosa desdobrou-se para a esfera pública nas últimas três décadas. O investimento maciço de pentecostais e católicos na compra de emissoras e na formação de redes de tevê exemplifica emblematicamente isso. Pela mesma razão, proliferaram os megatemplos e os megaeventos religiosos, efeitos de uma corrida desenfreada pela ocupação religiosa do espaço público.
Recente pesquisa realizada pelo Pew Research Center revela que cresceu muito e rapidamente o contingente dos norte-americanos sem filiação religiosa. Já são 19,6% dos norte-americanos (incluídos os 13 milhões ou 6% de ateus e agnósticos) sem filiação religiosa. E os jovens são, disparado, os menos filiados a grupos religiosos. Nada menos do que um terço (32%) dos norte-americanos abaixo de 30 anos são nones ou unaffiliated, isto é, sem filiação religiosa. Desde a Primeira Guerra, cada geração tem se revelado sempre menos religiosa do que a anterior.
Recrudescimento da competição entre pentecostais e católicos pela hegemonia religiosa no país. Tal competição intrarreligiosa desdobrou-se para a esfera pública nas últimas três décadas. O investimento maciço de pentecostais e católicos na compra de emissoras e na formação de redes de tevê exemplifica emblematicamente isso. Pela mesma razão, proliferaram os megatemplos e os megaeventos religiosos, efeitos de uma corrida desenfreada pela ocupação religiosa do espaço público.
Recente pesquisa realizada pelo Pew Research Center revela que cresceu muito e rapidamente o contingente dos norte-americanos sem filiação religiosa. Já são 19,6% dos norte-americanos (incluídos os 13 milhões ou 6% de ateus e agnósticos) sem filiação religiosa. E os jovens são, disparado, os menos filiados a grupos religiosos. Nada menos do que um terço (32%) dos norte-americanos abaixo de 30 anos são nones ou unaffiliated, isto é, sem filiação religiosa. Desde a Primeira Guerra, cada geração tem se revelado sempre menos religiosa do que a anterior.
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