Uma ação litúrgica que merece ser compreendida para melhor ser vivida
A segunda ação do Senhor (deu
graças) evoluiu para a ação litúrgica da grande Oração Eucarística: desde a
saudação e convite a “dar graças”, até o “Amém” final, cantado por toda a
assembléia. A terceira
ação do Senhor (partiu, repartiu o pão) evoluiu também para uma ação litúrgica
bem específica: a “fração do pão”. É o momento em que o sacerdote, antes da
comunhão, pega o pão consagrado e parte-o (em pequenos pedaços, se for o caso,
para ser também distribuído).
Trata-se de uma ação litúrgica de suma importância, mas ainda muito
pouco valorizada. É realizada muitas vezes de qualquer jeito, sem expressão, às
pressas, em plena movimentação do abraço da paz, de tal maneira que o povo nem
percebe. E por que não é valorizada? Porque ainda não atinamos com o seu
profundo sentido antropológico e teológico. Ela merece ser compreendida para
melhor ser vivida nas comunidades cristãs.
Todos já participamos de uma festa
de aniversário. Num dado momento da festa, acontece uma significativa ação
ritual que marca o ponto alto do evento. É o momento de cortar o bolo.
Observemos o que acontece. Todos se reúnem ao redor da mesa. Acendem-se as
velinhas. O aniversariante se posta diante daquele maravilhoso “símbolo” de sua
vida. Instante de expectativa e emoção. Os olhares de todos se concentram
brilhantes sobre o bolo iluminado e sobre o aniversariante feliz, como se ambos
fossem um só. Canta-se, com entusiasmo, o “Parabéns a você”.
O aniversariante apaga as velas, sob estrondosos vivas e salvas de
palmas. E aí vem o momento alto, acompanhado novamente de vivas e mais
aplausos: a ação “ritual” de cortar o bolo, que depois é distribuído a todos.
Então, a gente pergunta: e, na Missa, no momento da fração do pão, não seria
natural que tivéssemos uma “vibração” pelo menos um pouco parecida? Como é
valorizada a ação simbólico-ritual do “partir o pão” em nossas Missas ? Qual
é a “vibração” dos cristãos em relação a esse momento especial da Missa? Como é
o olhar de todos sobre o gesto de partir o pão sagrado? Dá para vibrar?
O primeiro
nome da Missa era “Fração do Pão”
Pelo jeito, temos que acordar e aprender (mesmo!) a valorizar mais o
momento da fração do pão na Missa. Afinal de contas, “Fração do Pão” foi o
primeiro nome da celebração eucarística. E o Catecismo da Igreja Católica nos
apresenta os motivos: a Missa se chamou “Fração do Pão”, porque esse rito,
próprio da refeição judaica, foi utilizado por Jesus quando abençoava e
distribuía o pão como presidente da mesa (cf. Mt 14,19; 15,36; Mc 8, 6-19),
sobretudo por ocasião da Última Ceia (cf. Mt 26,26; 1Cor 11,24).
É por esse gesto
que os discípulos o reconhecerão após a ressurreição
(cf. Lc 24,13-35), e é com essa expressão que os primeiros cristãos designarão
suas assembléias eucarísticas (cf. At 2,42-46; 20,7-11). Com isso querem dizer
que todos os que comem do único pão partido, Cristo,
entram em comunhão com Ele e já não formam senão um só corpo nele (cf.
cf. 1Cor 10,16-17) (n.º 1329).
Um sentido teológico por trás do gesto da “fração do pão”
Outro motivo para valorizar mais o gesto da “fração do pão”:
proveniente da tradição mais antiga da grande família cristã, que é a Igreja,
trata-se de uma ação litúrgica profundamente simbólica e de grande densidade
teológica. Comecemos relembrando o que Jesus fez e disse na última ceia. Ele
partiu o pão e disse: “Isto é o meu corpo entregue em favor de vocês... Façam
isso em memória de mim”. Meu corpo entregue!... Realmente, na cruz, seu corpo
foi entregue, quebrado e partido em favor de todos nós.
E esse mesmo corpo, agora ressuscitado, continua sendo entregue e
partido em nosso favor. Quando? Quando nos reunimos para o memorial de sua
paixão, morte, ressurreição, ascensão e dom do Espírito, na Missa, nossa Ceia
com o Senhor. Então, o que acontece: o rito da fração do pão nos torna visível
o mistério da morte e ressurreição de Jesus, pelo qual aconteceu o esmagamento
do pecado do mundo e a vitória sobre a morte. Em outras palavras, ao ver na Missa como o pão é
partido, contemplamos o mistério da morte e ressurreição de Jesus, seu corpo
entregue (estraçalhado) na cruz e agora repartido entre nós, para nossa
salvação. E tudo isso sem Ele falar, nem reclamar de nada.
É impressionante seu silêncio. É
como um cordeiro que, ao ser sacrificado, fica em total silêncio, não dá um
gemido. Por isso que, ao olhar o pão sendo partido, na ação litúrgica da fração
do pão, muito cedo as comunidades cristãs, impressionadas com o que viam,
começaram a cantar: “Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, tende
piedade de nós”. E tudo sem nos esquecermos também do sangue do Cordeiro derramado que, agora, depois da
ressurreição, não está separado do corpo, mas unido. Por isso que, ao partir o
pão consagrado, o sacerdote coloca um pedaço no cálice, rezando em
silêncio: “Esta união do Corpo e do Sangue de Jesus, o Cristo e Senhor nosso,
que vamos receber, nos sirva para a vida eterna”.
Concluindo
Os desafios em relação ao gesto
litúrgico da fração do pão já se evidenciaram de alguma maneira. Seu sentido
humano e teológico nos provoca a valorizá-lo melhor para melhor ser vivido. Se
assim o fizermos, como, aliás, nos orienta a Igreja na Instrução Geral ao
Missal Romano, “o gesto da fração do pão... (com certeza) manifestará mais
claramente o valor e a importância do sinal da unidade de todos num só corpo,
e da caridade fraterna pelo fato de um único pão ser
repartido entre os irmãos” (n.º 283).
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