Marcelo Barros
Desde que o papa Bento XVI anunciou sua renúncia ao papado, os meios de comunicação se apressam em antecipar os candidatos ao trono, ou simplesmente em descobrir em que ponto estão os acordos no Vaticano que, nos bastidores e com toda a elegância exigida pelos meios eclesiásticos, já há tempos, preparam o próximo conclave. Sem dúvida, merece toda a admiração a coragem e humildade com que o papa declara: “Não tenho mais força para exercer o papado”. De fato, nas últimas décadas, ao mesmo tempo que o mundo se tornou cada vez mais complexo e plural, o Vaticano ignorou a orientação do Concilio Vaticano II sobre a colegialidade dos bispos, diminuiu a função das conferências episcopais e concentrou o seu poder. Por isso, o ministério papal deve ter ficado bem mais pesado.
Muitos dos cardeais que em 2005 acharam que o cardeal Joseph Ratzinger seria a pessoa indicada para conduzir a Igreja Universal nesse início de século serão os mesmos que escolherão o próximo papa, além de alguns outros, escolhidos a dedo pelo próprio papa atual. Isso faz com que a tal lista dos prováveis candidatos ao cargo pontifício não tenha tanta importância. Ao que parece, seja quem for, afirmam vozes do episcopado brasileiro, “nada de profundo mudará”. Sem dúvida, eles dizem isso como quem dá uma boa notícia. Sinceramente, não sei se a maioria dos fiéis católicos, se pudessem se expressar, estariam de acordo.
Pessoalmente, não sou cardeal e, portanto, não participo dessa eleição, nem aceitaria essa responsabilidade. Mas, penso na multidão silenciosa de mais de um bilhão de fiéis católicos no mundo. Mesmo sem representar nenhum grupo ou ter algum mandato oficial, gostaria de expressar aqui o voto que penso ser da maioria dos leigos e leigas, engajados nas pastorais e grupos missionários católicos, formados a partir do Concilio Vaticano II, assim como de muitos religiosos, religiosas e presbíteros que, embora sem ser escutados, amam a nossa Igreja e desejam que, o Espírito sopre novamente sobre ela um novo Pentecostes.
A primeira coisa que gostaria de esclarecer é que, ao contrário do pensamento aqui e ali expresso nos meios de comunicação, quem é formado pelo espírito do Concílio pode aceitar que se eleja um papa latino-americano, africano ou coreano, como etapa no momento atual, dentro do sistema em que vivemos. Entretanto, em termos de princípio, o queremos é um papa italiano, o mais romano possível, que seja bispo de Roma e retome o espírito do Concílio Vaticano II, respeite a autonomia eclesiológica das Igrejas locais, cada uma delas, verdadeira Igreja, possuidora das características da comunhão universal, assim como um cada fragmento de pão consagrado contém em si todo o corpo de Cristo.
Pedimos a Deus que dê à Igreja de Roma, mãe da unidade de todas as Igrejas, um pastor simples e modesto que não precise mais de áurea de santidade, nem que se chame de santa a sua pessoa, a sé de Roma, as congregações da cúria e tudo o que cerca o seu ministério. Aí, no Glória de cada missa, cantaremos com mais sinceridade: Só tu és santo, ó Deus!”. Se esse irmão se assumir verdadeiramente como servo dos servos de Deus, a Igreja será como nos primeiros séculos uma Igreja mais sinodal e mais sacramento de comunhão da humanidade. Poderá assim ser cada vez mais sacramento e ensaio do mundo novo possível. Um dia, Dom Hélder Câmara, então arcebispo de Olinda e Recife, escreveu o seguinte: “Sonhei que o papa enlouquecia. E ele mesmo ateava fogo ao Vaticano e à Basílica de São Pedro. Loucura sagrada, porque Deus atiçava o fogo que os bombeiros, em vão, tentavam extinguir. O papa, louco, saía pelas ruas de Roma, dizendo adeus aos embaixadores, credenciados junto a ele; e espalhando pelos pobres o dinheiro todo do Banco do Vaticano. Que vergonha para os cristãos! Para que um papa viva o Evangelho, temos que imaginá-lo em plena loucura”[1].
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